116. Como e em que momento se opera a união da alma ao
corpo?
Desde a concepção, o Espírito, ainda que errante, está, por um
cordão fluídico, preso ao corpo com o qual se deve unir. Este laço se estreita
cada vez mais, à medida que o corpo se vai desenvolvendo. Desde esse momento, o
Espírito sente uma perturbação que cresce sempre; ao aproximar-se do nascimento,
ocasião em que ela se torna completa, o Espírito perde a consciência de si e não
recobra as idéias senão gradualmente, a partir do momento em que a criança
começa a respirar; a união então é completa e definitiva.
117. Qual o estado intelectual da alma da criança no momento
de nascer?
Seu estado intelectual e moral é o que tinha antes da união ao
corpo, isto é, a alma possui todas as idéias anteriormente adquiridas; mas, em
razão da perturbação que acompanha a mudança de estado, suas idéias se acham
momentaneamente em estado latente. Elas se vão esclarecendo aos poucos, mas não
se podem manifestar senão proporcionalmente ao desenvolvimento dos órgãos.
118. Qual a origem das idéias inatas, das disposições
precoces, das aptidões instintivas para uma arte ou ciência, abstração feita da
instrução?
As idéias inatas não podem ter senão duas fontes: a criação
das almas mais perfeitas umas que as outras, no caso de serem criadas ao mesmo
tempo que o corpo, ou um progresso por elas adquirido anteriormente à
encarnação.
Sendo a primeira hipótese incompatível com a justiça de Deus, só
fica de pé a segunda.
As idéias inatas são o resultado dos conhecimentos
adquiridos nas existências anteriores, são idéias que se conservaram no estado
de intuição, para servirem de base à aquisição de outras novas.
119. Como se podem revelar gênios nas classes da sociedade
inteiramente privadas de cultura intelectual?
É um fato que prova serem
as idéias inatas Independentes do meio em que o homem foi educado, O ambiente e
a educação desenvolvem as idéias inatas, mas não no-las podem dar. O homem de
gênio é a encarnação de um Espírito adiantado que muito houvera já progredido. A
educação pode fornecer a instrução que falta, mas não o gênio, quando este não
exista.
120. Por que encontramos crianças instintivamente boas em um
meio perverso, apesar dos maus exemplos que colhem, ao passo que outras são
instintivamente viciosas em um meio bom, apesar dos bons conselhos que
recebem?
É o resultado do progresso moral adquirido, como as idéias
inatas são o resultado do progresso intelectual.
121. Por que de dois filhos do mesmo pai, educados nas
mesmas condições, um é às vezes inteligente e o outro estúpido, um bom e o outro
mau? Por que o filho de um homem de gênio é, algumas vezes, um tolo, e o de um
tolo, um homem de gênio?
É um fato esse que vem em abono da origem das
idéias inatas; prova, além disso, que a alma do filho não procede, de sorte
alguma, da dos pais; se assim não fosse, em virtude do axioma que a parte é da
mesma natureza que o todo, os pais transmitiriam aos filhos as suas qualidades e
defeitos próprios, como lhes transmitem o princípio das qualidades corporais. Na
geração, somente o
corpo procede do corpo, mas as almas são independentes
umas das outras.
122. Se as almas são independentes umas das outras, donde
vem o amor dos pais pelos filhos e o destes por aqueles?
Os Espíritos se
ligam por simpatia, e o nascimento em tal ou tal família não é um efeito do
acaso, mas depende muitas vezes da escolha feita pelo Espírito, que vem
juntar-se àqueles a quem amou no mundo espiritual ou em suas precedentes
existências. Por outro lado, os pais têm por missão ajudar o progresso dos
Espíritos que encarnam como seus filhos, e, para excitá-los a isso, Deus lhes
inspira uma afeição mútua; muitos, porém, faltam a essa missão, sendo por isso
punidos. (O Livro dos Espíritos, nº 379, Da infância.)
123. Por que há maus pais e maus filhos?
São
Espíritos que não se ligaram na mesma família por simpatia, mas com o fim de
servirem de instrumentos de provas uns aos outros e, muitas vezes, para punição
do que foram em existência anterior; a um é dado um mau filho, porque também ele
o foi; a outro, um mau pai, pelo mesmo motivo, a fim de que sofram a pena de
talião. (Revue Spirite, 1861, pág. 270: La Peine du talion.)
124. Por que encontramos em certas pessoas, nascidas em
condição servil, instintos de dignidade e grandeza, enquanto outras, nascidas
nas classes superiores, só apresentam instintos de baixeza?
É uma
reminiscência intuitiva da posição social que o Espírito já ocupou, e do seu
caráter na existência precedente.
125. Qual a causa das simpatias e antipatias que se
manifestam entre pessoas que se vêem pela primeira vez?
São quase sempre
entes que se conheceram e, algumas vezes, se amaram em uma existência anterior,
e que, encontrando-se nesta, são atraídos um para o outro. As antipatias
instintivas provêm também, muitas vezes, de relações anteriores.
Esses dois
sentimentos podem ainda ter uma outra causa, O perispírito irradia ao redor do
corpo, formando uma espécie de atmosfera impregnada das qualidades boas ou más
do Espírito encarnado. Duas pessoas que se encontram, experimentam, pelo
contacto desses fluidos, a impressão sensitiva, impressão que pode ser agradável
ou desagradável; os fluidos tendem a confundir-se ou a repelir-se, segundo sua
natureza semelhante ou dessemelhante. Ë assim que se pode explicar o fenômeno da
transmissão de pensamento. Pelo contacto desses fluidos, duas almas, de algum
modo, lêem uma na outra; elas se adivinham e compreendem, sem se falarem.
126. Por que não conserva o homem a lembrança de suas
anteriores existências? Não será ela necessária ao seu progresso futuro? (Vede a
parte que trata do Esquecimento do passado).
Esquecimento do
passado:V. — Não consigo explicar a mim mesmo como pode o homem
aproveitar da experiência adquirida em suas anteriores existências, quando não
se lembra delas, pois que, desde que lhe falta essa reminiscência, cada
existência é para ele qual se fora a primeira; deste modo, está sempre a
recomeçar.
Suponhamos que cada dia, ao despertar, perdemos a memória de tudo
quanto fizemos no dia anterior; quando chegássemos aos setenta anos, não
estaríamos mais adiantados do que aos dez; ao passo que recordando as nossas
faltas, inaptidões e punições que disso nos provieram, esforçar-nos-emos por
evitá-las.
Para me servir da comparação que fizestes do homem, na Terra, com
o aluno de um colégio, eu não compreendo como este poderia aproveitar as lições
da quarta classe, não se lembrando do que aprendeu na anterior.
Essas
soluções de continuidade na vida do Espírito interrompem todas as relações e
fazem dele, de alguma sorte, uma entidade nova; do que podemos concluir que os
nossos pensamentos morrem com cada uma das nossas existências, para renascer em
outra, sem consciência do que fomos; é uma espécie de aniquilamento.
A. K. —
De pergunta em pergunta, levar-me-eis a fazer um curso completo de Espiritismo;
todas as objeções que apresentais são naturais em quem ainda nada conhece, mas
que, mediante estudo sério, pode encontrar-lhes respostas muito mais explícitas
do que as que posso dar em sumária explicação que, por certo, deve sempre ir
provocando novas questões.
Tudo se encadeia no Espiritismo, e, quando se toma
o conjunto, vê-se que seus princípios emanam uns dos outros, servindo-se
mutuamente de apoio; e, então, o que parecia uma anomalia, contrária à justiça e
à sabedoria de Deus, se torna natural e vem confirmar essa justiça e essa
sabedoria. Tal é o problema do esquecimento do passado, que se prende a outras
questões de não menor importância e, por isso, não farei aqui senão tocar
levemente o assunto.
Se em cada uma de suas existências um véu esconde o
passado do Espírito, com isso nada perde ele das suas aquisições, apenas esquece
o modo por que as conquistou.
Servindo-me ainda da comparação supra com o
aluno, direi que pouco importa saber onde, como, com que professores ele estudou
as matérias de uma classe, uma vez que as saiba, quando passa para a classe
seguinte. Se os castigos o tornaram laborioso e dócil, que lhe importa saber
quando foi castigado por preguiçoso e insubordinado?
É assim que,
reencarnando, o homem traz por intuição e como idéias inatas, o que adquiriu em
ciência e moralidade. Digo em moralidade porque, se no curso de uma existência
ele se melhorou, se soube tirar proveito das lições da experiência, se tornará
melhor quando voltar; seu Espírito, amadurecido na escola do sofrimento e do
trabalho, terá mais firmeza; longe de ter de recomeçar tudo, ele possui um fundo
que vai sempre crescendo e sobre o qual se apóia para fazer maiores
conquistas.
A segunda parte da vossa objeção, relativa ao aniquilamento do
pensamento, não tem base mais segura, porque esse olvido só se dá durante a vida
corporal; uma vez terminada ela, o Espírito recobra a lembrança do seu passado;
então poderá julgar do caminho que seguiu e do que lhe resta ainda fazer; de
modo que não há essa solução de continuidade em sua vida espiritual, que é a
vida normal do Espírito. Esse esquecimento temporário é um benefício da
Providência; a experiência só se adquire, muitas vezes, por provas rudes e
terríveis expiações, cuja recordação seria muito penosa e viria aumentar as
angústias e tribulações da vida presente.
Se os sofrimentos da vida parecem
longos, que seria se a ele se juntasse a lembrança do passado?
Vós, por
exemplo, meu amigo, sois hoje um homem de bem, mas talvez devais isso aos rudes
castigos que recebestes pelos malefícios que hoje vos repugnariam à consciência;
ser-vos-ia agradável a lembrança de ter sido outrora enforcado por vossa
maldade? Não vos perseguiria a vergonha de saber que o mundo não ignorava o mal
que tínheis feito? Que vos importa o que fizestes e o que sofrestes para expiar,
quando hoje sois um homem estimável? Aos olhos do mundo, sois um homem novo, e
aos olhos de Deus um Espírito reabilitado. Livre da reminiscência de um passado
importuno, viveis com mais liberdade; é para vós um novo ponto de partida;
vossas dívidas anteriores estão pagas, cumprindo-vos ter cuidado de não contrair
outras.
Quantos homens desejariam assim poder, durante a vida, lançar um véu
sobre os seus primeiros anos! Quantos, ao chegar ao termo de sua carreira, não
têm dito: “Se eu tivesse de recomeçar, não faria mais o que fiz!” Pois bem, o
que eles não podem fazer nesta mesma
vida, fá-lo-ão em outra; em uma nova
existência, seu Espírito trará, em estado de intuição, as boas resoluções que
tiver tomado. É assim que se efetua gradualmente o progresso da
humanidade.
Suponhamos ainda — o que é um caso muito comum — que, em vossas
relações, em vossa família mesmo se encontre um indivíduo que vos deu outrora
muitos motivos de queixa, que talvez vos arruinou, ou desonrou em outra
existência, e que, Espírito arrependido, veio encarnar-se em vosso meio,
ligar-se a vós pelos laços de família, a fim de reparar suas faltas para
convosco, por
seu devotamento e afeição; não vos acharíeis mutuamente na
mais embaraçosa posição, se ambos vos lembrásseis de vossas passadas inimizades?
Em vez de se extinguirem, os ódios se eternizariam.
Disso resulta que a
reminiscência do passado perturbaria as relações sociais e seria um tropeço ao
progresso. Quereis uma prova?
Supondo que um indivíduo condenado às galés
tome a firme resolução de tomar-se um homem de bem, que acontece quando ele
termina o cumprimento da pena? A sociedade o repele, e essa repulsa o lança de
novo nos braços do vício. Se, porém, todos desconhecessem os seus antecedentes,
ele seria bem acolhido; e, se ele mesmo os esquecesse, poderia ser honesto e
andar de cabeça erguida, em vez de ser obrigado a curvá-la sob o peso da
vergonha do que não pode olvidar.
Isto está em perfeita concordância com a
doutrina dos Espíritos, a respeito dos mundos superiores ao nosso planeta, nos
quais, só reinando o bem, a lembrança do passado nada tem de penosa; eis por que
seus habitantes se recordam da sua existência precedente, como nós nos
recordamos hoje do que ontem fizemos.
Quanto à lembrança do que fizeram em
mundos inferiores, ela produz neles a impressão de um mau sonho. (1ª parte, cap.
19)
127. Qual a origem do sentimento a que chamamos
consciência?
É uma recordação intuitiva do progresso feito nas
precedentes existências e das resoluções tomadas pelo Espírito antes de
encarnar, resoluções que ele, muitas vezes, esquece como homem.
128. Tem o homem o livre-arbítrio, ou está sujeito à
fatalidade?
Se a conduta do homem fosse sujeita à fatalidade, não haveria
para ele nem responsabilidade do mal, nem mérito do bem que pratica. Toda
punição seria uma injustiça, toda recompensa um contra-senso, O livre-arbítrio
do homem é uma conseqüência da justiça de Deus, é o atributo que a divindade
imprime àquele e o eleva acima de todas as outras criaturas. É isto tão real que
a estima dos homens, uns pelos outros, baseia-se na admissão desse
livre-arbítrio; quem, por uma enfermidade, loucura, embriaguez ou idiotismo,
perde acidentalmente essa faculdade, é lastimado ou desprezado.
O
materialista que faz todas as faculdades morais e intelectuais dependerem do
organismo, reduz o homem ao estado de máquina, sem livre-arbítrio e, por
conseqüência, sem responsabilidade do mal e sem mérito do bem que pratica.
(Revue Spirite, 1861, pág. 76; La tête de Garibaldi — Idem, 1862, pág. 97:
Phrénologie spiritualiste.)
129. Será Deus o criador do mal?
Deus não criou o
mal; Ele estabeleceu leis, e estas são sempre boas, porque Ele é soberanamente
bom; aquele que as observasse fielmente, seria perfeitamente feliz; porém, os
Espíritos, tendo seu livre-arbítrio, nem sempre as observam, e é dessa infração
que provém o mal.
130. O homem já nasce bom ou mau?
É preciso fazermos
uma distinção entre a alma e o homem. A alma é criada simples e ignorante, isto
é, nem boa nem má, porém suscetível, em razão do seu livre-arbítrio, de seguir o
bom ou o mau caminho, ou, por outra, de observar ou infringir as leis de Deus. O
homem nasce bom ou mau, segundo seja ele a encarnação de um Espírito adiantado
ou atrasado.
131. Qual a origem do bem e do mal na Terra e por que este
predomina?
A imperfeição dos Espíritos que aqui se encarnam, é a origem
do mal na Terra; quanto à predominância deste, provém da inferioridade do
planeta, cujos habitantes são, na maioria, Espíritos inferiores ou que pouco têm
progredido. Em mundos mais adiantados, onde só encarnam Espíritos depurados, o
mal não existe ou está em minoria.
132. Qual a causa dos males que afligem a
humanidade?
O nosso mundo pode ser considerado, ao mesmo tempo, como
escola de Espíritos pouco adiantados e cárcere de Espíritos criminosos. Os males
da nossa humanidade são a conseqüência da inferioridade moral da maioria dos
Espíritos que a formam. Pelo contato de seus vícios, eles se infelicitam
reciprocamente e punem-se uns aos outros.
133. Por que vemos tantas vezes o mau prosperar, enquanto o
homem de bem vive em aflição?
Para aquele cujo pensamento não transpõe as
raias da vida presente, para quem a acredita única, isto deve parecer clamorosa
injustiça. Não se dá, porém, o mesmo com quem admite a pluralidade das
existências e pensa na brevidade de cada uma delas, em relação à eternidade. O
estudo do Espiritismo prova que a prosperidade do mau tem terríveis
conseqüências em suas seguintes existências; que as aflições do homem de bem
são, pelo contrário, seguidas de uma felicidade, tanto maior e duradoura, quanto
mais resignadamente ele soube suportá-las; não lhe será mais que um dia mau em
uma existência próspera.
134. Por que nascem alguns na indigência e outros na
opulência? Por que vemos tantas pessoas nascerem cegas, surdas, mudas ou
afetadas de moléstias incuráveis, enquanto outros possuem todas as vantagens
físicas? Será um efeito do acaso, ou um ato da Providência?
Se fosse do
acaso, a Providência não existiria. Admitida, porém, a Providência, perguntamos
como se conciliam esses fatos com a sua bondade e justiça? É por falta de
compreensão da causa de tais males que muitos se arrojam a acusar
Deus.
Compreende-se que quem se torna miserável ou enfermo, por suas
imprudências ou por excessos, seja punido por onde pecou: porém, se a alma é
criada ao mesmo tempo que o corpo, que fez ela para merecer tais aflições, desde
o seu nascimento, ou para ficar isenta delas?
Se admitimos a justiça de Deus,
não podemos deixar de admitir que esse efeito tem uma causa; e se esta causa não
se encontra na vida presente, deve achar-se antes desta, porque em todas as
coisas a causa deve preceder ao efeito; há, pois, necessidade de a alma já ter
vivido, para que possa merecer uma expiação.
Os estudos espíritas nos
mostram, de fato, que mais de um homem, nascido na miséria, foi rico e
considerado em uma existência anterior, na qual fez mau uso da fortuna que Deus
o encarregara de gerir; que mais de um, nascido na abjeção, foi anteriormente
orgulhoso e prepotente, abusou do poder para oprimir os fracos. Esses estudos
no-los fazem ver, muitas vezes, sujeitos àqueles a quem trataram com dureza,
entregues aos maus-tratos e à humilhação a que submeteram os outros.
Nem
sempre uma vida penosa é expiação; muitas vezes é prova escolhida pelo Espírito,
que vê um meio de avançar mais rapidamente, conforme a coragem com que saiba
suportá-la.
A riqueza é também uma prova, mas muito mais perigosa que a
miséria, pelas tentações que dá e pelos abusos que enseja; também o exemplo dos
que viveram, demonstra ser ela uma prova em que a vitória é mais difícil. A
diferença das posições sociais seria a maior das injustiças — quando não seja o
resultado da conduta atual — se ela não tivesse uma compensação. A convicção que
dessa verdade adquirimos, pelo Espiritismo, nos dá força para suportarmos as
vicissitudes da vida e aceitarmos a nossa sorte, sem invejar a dos outros.
135. Por que há homens idiotas e imbecis? (No sentido
de deficiência, termo médico, não pejorativo - nota nossa)
A posição dos
idiotas e dos imbecis seria a menos conciliável com a justiça de Deus, na
hipótese da unicidade da existência. Por miserável que seja a condição em que o
homem nasça, ele poderá sair dela por sua inteligência e trabalho; o idiota e o
imbecil, porém, são votados, desde o nascimento até a morte, ao embrutecimento e
ao desprezo; para eles não há compensação possível. Por que foi, então, sua alma
criada idiota?
Os estudos espíritas, feitos acerca dos imbecis e idiotas,
provam que suas almas são tão inteligentes como as dos outros homens; que essa
enfermidade é uma expiação infligida a Espíritos que abusaram da inteligência, e
sofrem cruelmente por se sentirem presos, em laços que não podem quebrar, e pelo
desprezo de que se vêem objeto, quando, talvez, tenham sido tão considerados em
encarnação precedente. (Revue Spirite, 1860, pág. 173; L’Esprit d’um idiot. —
Idem, 1861, pág. 311: Les crétins.)
136. Qual o estado da alma durante o sono?
No sono é
só o corpo que repousa, mas o Espírito não dorme. As observações práticas provam
que, nessas condições, o Espírito goza de toda a liberdade e da plenitude das
suas faculdades; aproveita-se do repouso do corpo, dos momentos em que este lhe
dispensa a presença, para agir separadamente e ir aonde quer. Durante a vida,
qualquer que seja a distância a que se transporte, o Espírito fica sempre preso
ao corpo por um cordão fluídico, que serve para chamá-lo, quando a sua presença
se torna necessária. Só a morte rompe esse laço.
137. Qual a causa dos sonhos?
Os sonhos são o
resultado da liberdade do Espírito durante o sono; às vezes, são a recordação
dos lugares e das pessoas que o Espírito viu ou visitou nesse estado. (O Livro
dos Espíritos: Emancipação da alma, sono, sonhos, sonambulismo, vista dupla,
letargia, etc., nºs 400 e seguintes. — O Livro dos Médiuns: Evocação das pessoas
vivas nº 284. — Revue Spirite, 1860, pág. 11: L’Esprit d’um côté et Le corps de
l’autre. — Idem, 1860, pág. 81: étude sur l’Esprit des persomnes vivantes.)
138. Donde vêm os pressentimentos?
São recordações
vagas e intuitivas do que o Espírito aprendeu em seus momentos de liberdade e
algumas vezes avisos ocultos dados por Espíritos benévolos.
139. Por que há na Terra selvagens e homens
civilizados?
Sem a preexistência da alma, esta questão é insolúvel, a
menos que admitamos tenha Deus criado almas selvagens e almas civilizadas, o que
seria a negação da sua justiça. Além disso, a razão recusa admitir que, depois
da morte, a alma do selvagem fique perpetuamente em estado de inferioridade, bem
como se ache na mesma elevação que a do homem esclarecido.
Admitindo para as
almas um mesmo ponto de partida — única doutrina compatível com a justiça de
Deus —, a presença simultânea da selvageria e da civilização, na Terra, é um
fato material que prova o progresso que uns já fizeram e que os outros têm de
fazer.
A alma do selvagem atingirá, pois, com o tempo, o mesmo grau da alma
esclarecida; mas, como todos os dias morrem selvagens, essa alma não pode
atingir esse grau senão em encarnações sucessivas, cada vez mais aperfeiçoadas e
apropriadas ao seu adiantamento, seguindo todos os graus intermediários a esses
dois extremos.
140. Não será admissível, segundo pensam algumas pessoas,
que a alma, não encarnando mais que uma vez, faça o seu progresso no estado de
Espírito ou em outras esferas?
Esta proposição seria admissível, se todos
os habitantes da Terra se achassem no mesmo nível moral e intelectual; caso em
que se poderia dizer ser a Terra destinada a determinado grau; ora, quantas
vezes temos diante de nós a prova do contrário!
Com efeito, não é
compreensível que o selvagem não pudesse conseguir civilizar-se aqui na Terra,
quando vemos almas mais adiantadas encarnadas ao lado dele; do que resulta a
possibilidade da pluralidade das existências terrenas, demonstrada por exemplos
que temos à vista.
Se fosse de outro modo, era preciso explicar: por que só a
Terra teria o monopólio das encarnações; 2º, por que, tendo esse monopólio, nela
se apresentam almas encarnadas de todos os graus.
141. Por que, no meio das sociedades civilizadas, se mostram
seres de ferocidade comparável à dos mais bárbaros selvagens?
São
Espíritos muito inferiores, saídos das raças bárbaras, que experimentam
reencarnar em meio que não é o seu, e onde estão deslocados, como estaria um
rústico colocado de repente numa cidade adiantada.
OBSERVAÇÃO — Não é
possível admitir-se, sem negar a Deus os atributos de bondade e justiça, que a
alma do criminoso endurecido tenha, na vida atual, o mesmo ponto de partida que
a de um homem cheio de virtudes.
Se a alma não é anterior ao corpo, a do
criminoso e a do homem de bem são tão novas uma como a outra; por que razão,
então, uma delas é boa e a outra má?
142. Donde vem o caráter distintivo dos povos?
São
Espíritos que têm mais ou menos os mesmos gostos e inclinações, que encarnam em
um meio simpático e, muitas vezes, no mesmo meio em que podem satisfazer as suas
inclinações.
143. Como progridem e como degeneram os povos?
Se a
alma é criada juntamente com o corpo, as dos homens de hoje são tão novas, tão
primitivas, como a dos homens da Idade Média, e, desde então, pergunta-se por
que têm elas costumes mais brandos e inteligência mais desenvolvida?
Se na
morte do corpo a alma deixa definitivamente a Terra, pergunta-se, ainda, qual
seria o fruto do trabalho feito para melhoramento de um povo, se este tivesse de
ser recomeçado com as almas novas que diariamente chegam?
Os Espíritos
encarnam em um meio simpático e em relação com o grau do seu adiantamento.
Um
chinês, por exemplo, que progredisse suficientemente e não encontrasse mais na
sua raça um meio correspondente ao grau que atingiu, encarnará entre um povo
mais adiantado. À medida que uma geração dá um passo para frente, atrai por
simpatia Espíritos mais avançados, os quais são, talvez, os mesmos que já haviam
vivido no mesmo país e que, por seu progresso, dele se tinham afastado; é assim
que, passo a passo, uma nação avança. Se a maioria dos seus novos habitantes
fosse de natureza inferior e os antigos emigrassem diariamente e não mais
descessem a um meio inferior, o povo acabaria por degenerar, e, afinal, por
extinguir-se.
OBSERVAÇÃO — Essas questões provocam outras que
encontram solução no mesmo principio; por exemplo, donde vem a diversidade de
raças, na Terra? — Há raças rebeldes ao progresso? — A raça negra é suscetível
de subir ao nível das raças européias?* — A
escravidão é útil ao progresso das raças inferiores? — Como se pode operar a
transformação da Humanidade? — (O Livro dos Espíritos: Lei de progresso, nºs 776
e seguintes. — Revue Spirite, 1862, pág. 1: Doctrine des anges déchus. — Idem,
1862, pág. 97: Perfectibilité de la rase négre.)